​    ​Carnaval 2025

Catharina Rosa Ferreira de Jesus foi uma africana da Costa da Mina trazida para São Luís como escrava. Depois de alforriada torna-se a maior comerciante mulher da Praia Grande, principal centro mercantil da cidade. Frequentes anúncios de sua próspera atividade podem ser encontrados nos jornais de circulação da época, bem como no Almanaque do Maranhão.

Sem julgar ou desmerecer ninguém, não posso deixar de acusar perversa a narrativa que aprisiona Catharina a uma história que não é a sua. Uma vendedora de quitutes em uma banca no pé da escadaria do beco que recebe seu nome, onde além da venda de comida seduzia e conquistava caixeiros viajantes.

ESCRAVA DE GANHO – mulheres que traziam na ancestralidade vocação para o comercio e na bagagem experiência econômica desenvolvida nos países da antiga Costa da Mina.

Com autorização de seus senhores, essas africanas circulavam pela região comprando e vendendo frutas, quitutes, comida e mercadorias, habitavam casas ou quartinhos de aluguel, e estabeleciam seus horários de trabalho. Como estímulo, recebiam pequena parcela daquilo que apuravam, assim conseguiam suas alforrias e, muitas delas, vida próspera.

PRETAS MINAS FORRAS – “Empoderamento, na perspectiva de Paulo Freire compreende a ideia de minimizar os efeitos de opressões, a partir de uma conscientização do social e do coletivo. Jamais de forma exclusivamente individual. ”

Ainda que o feminismo classista defendido por mulheres brancas não reconheça, o empoderamento feminino experimentado hoje no Brasil tem sua origem nas chamadas pretas minas forras, mulheres independentes, senhoras de suas vontades, que viviam completamente diferente da realidade da grande maioria das demais mulheres da colônia.

"Catharina Rosa Ferreira de Jesus tem farinha para vender, o alqueire a 500 rs. e 600 rs; quem quiser comprar dirija-se a sua casa na Rua da Palha n° 5, ou no seu armazém na Rua da Calçada n° 7, ou na Praça do Comércio aonde se costuma vender. Tem ainda" (PUBLICADOR MARANHENSE, 08 a 10 de agost./1852, p.4)

Dona Catharina tem seu nome marcado naquele beco não por seus sabores, equivocadamente difundido até hoje, mas por suas posses. Na rua da Calçada, hoje Beco Catharina Mina, ela foi proprietária de dois casarões. Inicialmente seu armazém foi localizado onde hoje funciona a Casa de Cultura Huguenote Daniel de La Touche, depois o prédio da esquina na Rua do Trapiche (Portugal) na outra margem da rua, também passa a ser dela, transferindo seu armazém para lá e alugando o sobrado anterior para moradia. Aliás, essa era mais uma de suas atividades econômicas. Possuía vários imóveis alugados para moradias.

Dona Catharina teve um filho, Pedro Amaro dos Santos, que faleceu no dia 01 de novembro de 1859, com 33 anos. Teve como companheiro o cafuzo Quintino Antônio Pereira, sapateiro, bem-sucedido com loja aberta na Praça Benedito Leite.

“Quintino Antônio Pereira em sua loja no Largo de João do Vale, casa nº1, tem grande sortimento de sapatos de pano bordado de lã, chegados ultimamente de Hamburgo, feitos e em cortes, tanto para homens, como para senhoras e do melhor gosto possível, por preço cômodo. (PUBLICADOR MARANHENSE, 25/jan. a 23/fev., 1851)

Comerciante próspera, respeitada, e muito bem relacionada, Dona Catharina Rosa quando faleceu em 1886, com 87 anos, libertou seus 21 escravos, dividindo seus bens entre eles e alguns afilhados adquiridos ao longo da vida, já que tanto Quintino, seu companheiro, como Pedro, seu filho, já haviam morrido. Em 1874 o jornal Publicador Maranhense, na página 4 de sua edição do dia 18 de abril, faz o seguinte anúncio: "Catharina Rosa Ferreira de Jesus declara ao comércio desta cidade que nada deve por não comprar fiado, previne mais, que não é responsável por débito algum contraído em seu nome". Daí se ver quão ajuizada e afortunada foi Catharina, que se tiver tido sua última vontade respeitada tem seus restos mortais depositados em seu jazigo localizado na Igreja de Santo Antônio, junto com Pedro.

Em comemoração ao tricentenário da fundação da cidade de Santa Maria de Belém, capital do Estado do Grão-Pará em 1923, João Afonso escreveu uma obra chamada Três Séculos de Moda, qual fez uma análise de 1616 a 1916, focado nas vestes da nobreza, no entanto antes de concluí-la resolve falar de uma classe que, segundo ele, é inteiramente o contrário da moda propriamente dita. Assim faz menções a várias vestes em diversos cantos do mundo até chegar ao Maranhão para citar Dona Catharina especificamente.

"Chegando ao Maranhão, se ali já não for habitual cruzar nas ruas a 'Preta Mina' pelo menos haverá quem se recorde de a ter visto, a menos de cinquenta anos, pomposamente adereçada nos dias das grandes festas. A 'Preta Mina' vestia camisa e saia: camisa decotada, de mangas curtas, toda guarnecida de belíssima renda de almofada, quando não era de labyrintho ou de ‘cacundê’; saia de finíssimo e alvíssimo linho, tendo na beira largo folho, também de renda, como de renda é o lencinho que ela cuidadosamente segura na mão direita [....]”

O autor continua a descrever a Dona Catharina comparando-a as saloias portuguesas (mulheres que vivem nos arredores de Lisboa)

“[...] e se a saloia portuguesa exibe, no dia do oráculo da sua paróquia, o melhor de seus haveres, representados em dixes e teteias de ouro, o ‘ouro’ da ‘preta mina’ é muito mais abundante, e mesmo muito mais sólido: na cabeça um par de pentes, e um par de ‘travessas’ de tartaruga, chapeados de ouro cinzelado; nas orelhas, enormes brincos de ouro, obra do Porto; a começar do pescoço, até ao decote da camisa, não se vê a pele do colo, oculta sob uma sucessão de enfiadas de contas de ouro em grossos bagos, a última das quais tem dependurado, no centro, um grande crucifixo de ouro maciço, e, por último, em separado um cordão de fortes elos de ouro, de que prendem, na frente e nas costas, os ‘bentinhos’, ou ‘escapulários’, de N.S. do Carmo ou de N. S. das Mercês, segundo a confraria a que pertencia [...]”

O ouro era símbolo de riqueza e poder daquela época. Dona Catharina não hesitava em demonstrar sua fortuna. Desse modo, Afonso finaliza sua descrição assim: 

“[...] nos braços, dois ou três pares de braceletes, de pulseiras de ouro, de adentada grossura e esquisitos feitios, em cada dedo das duas mãos, dois três, quatro anelões de ouro, de variados lavores. E com toda essa ostentação de estofos finos, rendas caras e adornos de ouro, a preta mina vai descalça. Há de haver provavelmente em São Luís, quem reconheça no tipo que assim fica descrito a abastada capitalista Catharina Mina, negociante de farinha, com armazém à rua do Trapiche, que teve o capricho de casar com um cafuzo, para quem arranjou uma patente de alferes da Guarda Nacional."

AS IRMANDADES - As irmandades não estavam subordinadas a uma ordem religiosa, eram associações formadas por leigos dedicadas ao incremento da devoção aos santos e santas da Igreja católica. Cada irmandade era regida por um estatuto ou compromisso, que era submetido à aprovação régia, no qual estava registrada as regras do funcionamento da associação e os direitos e os deveres de seus membros. Ser membro de uma irmandade era uma necessidade social inscrita na sociedade colonial, alguém que não participasse da vida religiosa, seja nas igrejas paroquiais, seja nas irmandades, seria de certa forma visto com desconfiança. Dona Catharina era membro de pelo menos quatro irmandades de pretos: São Benedito; N.S. da Conceição dos Mulatos; N. S. do Rosário; N. S. das Mercês.

A FESTA - O calendário de festas religiosas e procissões proporcionava à população momentos de convívio social, sobretudo às mulheres, rompendo seu cotidiano.

“Como é costume de todos os anos no próximo domingo será celebrada, a expensas da Sr.ª Catharina Rosa Ferreira de Jesus, a festa de São Pedro, devoção especial, havendo sábado, ladainha na Matriz [São João Batista de Vinhais] às 7 horas da noite, e missa ao domingo às 7 horas da manhã, durante a qual tocará no coro, uma orquestra ida desta cidade”, (PACOTILHA, 27/dez./1884, p.3)

Os dias das festas dos santos e santas venerados pelas irmandades de negros eram ocasiões onde as tradições africanas se manifestavam. Momentos de afirmação de identidade cultural, mas também oportunidade de lutar pela sobrevivência de cada irmandade, uma vez que nesses dias havia a arrecadação de doações, que auxiliava a comunidade a manter a associação, tornando-se o único lugar de convívio social dessa população fora do mundo do trabalho.

E é nessa atmosfera de força e resistência africana que conduziu a vida e obra desta ilustre e admirável Preta, que a Turma da Mangueira chega na passarela Chico Coimbra para numa grande celebração ancestral homenagear Catharina Rosa Ferreira de Jesus a nossa a Portentosa Catharina Mina.

 


Sinopse do enredo

Itamilson Lima


Agradecimento especial a Profª Mundinha Araújo, sem a qual não teria sido possível a construção desse enredo, uma vez que foram as referências de sua pesquisa que fundamentaram nosso texto.   

Letra do Samba


autores: Silvio Rayol, Diego Silva, Marcos Ribeiro, Daniel Mendes, Berg da Pindoba, Marlon Melo, Walmir Salles

Mangueira é um templo de axé, tão majestosa a força da mulher, laroyê ê mojubá, abre os caminhos pretas minas vão passar

Dona Catharina, a sua história vou revisitar. Guiada no poder da sua sina, veio de mina pelas águas de yemanjá. Aportou nesse chão, pela liberdade clamou. Com sabedoria, legado que se consagrou. Comerciante, um dom ancestral. Empoderada, mulher genial. Resistência africana. Com garra descaminho enfrentou. A própria alforria conquistou

Eu vou bater tambor, pra São Benedito. Rezar pra Conceição dos Mulatos. Saudar a Senhora das  Mercês. Viva a virgem do Rosário. 

O destino abençoou. Na Praia Grande o teu nome exaltado. Beco adorado, o teu apogeu. A São Pedro um banquete ofereceu. Ê Catharina, luz de uma nação. De irmãs e Irmãos. Outrora aprisionado na mentira. Hoje a "verde e rosa" reconta tua vida.

Bia Maranhão - importante integrante da equipe artística da escola

Há mais de duas décadas na escola, Bia Maranhão, empresária do ramo da beleza, já foi Rainha de Bateria, Manga Rosa Gay, coordenadora de destaques. Hoje, além de instrutora em oficinas de arte plumária, é responsável pela criação e confecção dos dois casais de Mestre sala e Porta bandeira da escola, além de desfilar como destaque central.

Suzany D'Castro

Profissional da beleza, Suzany D'Castro desde 2018 desfila como destaque central da Turma da Mangueira. Foliã conhecida do carnaval maranhense, antes de vir para nossa escola passou por várias outras escolas da cidade.  

Surama Wilker

Há quase duas décadas entregando luxo e beleza nas alegorias da escola, Surama Wilker, profissional da beleza, além de desfilar como destaque é responsável pela produção (cabelo e maquiagem) das Rainha e madrinha da bateria.



Nosso competente

 time de canto




Orgulho dessa turma nota 30. Temos um 

time profissional, que entra na avenida 

sabendo o que precisa ser feito, entregam

 maestria e gabaritam o quesito.

Claudenir Rodolfo

Atual presidente da Turma da Mangueira tem a responsabilidade de preparar a escola para seu centenário, fortalecendo vínculos, preservando histórias e valorizando o samba como movimento caracterizador da identidade nacional  

Escreva algo...